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sábado, 28 de agosto de 2010

Pressupostos e Subentendidos

Um pouco de teoria

A leitura reflexiva é considerada um ato cognitivo que envolve processos múltiplos, como percepção e reflexão sobre um conjunto complexo de componentes de que se constitui a estrutura de um texto.

Na sua compreensão, estão envolvidas as ativações do conhecimento prévio, o conhecimento sobre a estrutura textual e a ativação do conhecimento de mundo. Tudo isso é criação de sentidos. Alia-se a isso o contexto social, político e histórico, como forma de tornar clarividente a formulação discursiva.

Neste percurso entre destinador e destinatário, há um texto formal, polifônico, que medeia a comunicação, a interação. Por isso, deve haver pelo menos o mínimo de comunicabilidade entre as partes envolvidas, para que este enunciado seja de fato um texto para quem o leia. A isso, chamar-se-á de princípio de cooperação, segundo o qual os participantes devem partilhar um certo grau de conhecimento e colaborar para o sucesso da troca verbal, em que cada um sabe dos seus direitos e deveres, bem como dos direitos e deveres do outro.

Partindo do princípio de que para construir a interpretação de um texto é necessário que o destinatário respeite as "regras do jogo", defende-se a ideia da existência de um saber mutuamente conhecido, em que cada um (destinador e destinatário) aceita as regras e espera que seu parceiro no jogo respeite-as também.

Essas regras são chamadas de leis do discurso, normas que desempenham um papel importante na interpretação de enunciados e devem ser respeitadas pelos interlocutores participantes do ato comunicativo. A AD na busca de sentidos não vai investigar apenas o texto em sua estrutura interna, mas também descortinar todo envolto social, o que lhe é externo e o que contribui para produção efetiva dos sentidos.

Caso houvesse a produção textual com a exaustiva necessidade explicitar todo conteúdo informacional, demandaria tempo e espaço do suporte em que se veicula o texto. Por este motivo, é importante ressaltar a importância dos pressupostos e subentendidos como recursos de coerência e economia verbal. Não raras vezes, o jogo de sentido que o envolve faz parte do escopo teórico da análise do discurso, uma vez que do que se omite e do que se pressupõe pode-se perceber por meio de uma investigação do que é externo ao texto, relacionado-o ao seu contexto, caminhando para uma análise do discurso .

Quando Fiorin teoriza sobre “a linguagem em uso”, reafirma o caráter social e pragmático da linguagem, caso de notícia em questão. Não é apenas a língua como “espelho” representação do mundo, mas também como comunicação, como ferramenta de uso, de ação.

Um texto, seja ele um enunciado oral ou escrito, é um processo de escolhas, uma produção com objetivos e funções previamente definidas. Por isso, a análise estrutural, que preteria o contexto e o papel social do falante em detrimento de uma análise puramente interna à estrutura da língua, perdeu força para uma investigação mais pragmática. Com isso, a língua passa-se a ser analisada com critérios também do momento da enunciação, levando-se em conta o contexto, o lugar de onde se fala, quem fala e para quem se fala. A língua, então, produz seus discursos, seus intertextos e formulações discursivas na prática, em seu uso pelos seus falantes. Podemo observar isso, nesta notícia em que a informação requer do leitor uma participação efetiva, ativa jogando com os sentidos implícitos, não só na materialidade do texto.

De um modo geral, pode-se afirmar que o que está subentendido em um texto é o que está contido numa proposição, sem, contudo, estar expresso formalmente, manifestado pelo que se pode depreender por um cálculo interpretativo do leitor, mas não claramente declarado. Diz-se que o conteúdo subentendido reclama uma interpretação mais subjetiva do leitor, enquanto que a pressuposição, que é mais lógica, reclama mais analogia. Dessa forma o que é implícito no texto depende de um jogo de sentidos que o autor (destinador) acredita ser o seu leitor (destinatário) capaz de elucidar.

O conteúdo subentendido é tácito o que quer dizer o texto deixa pistas, marcas significativas que se entende, mas que não foi expresso na materialidade fônica, dependendo de uma análise maior. Assim, o leitor será levado a inferir uma proposição implícita, denominada implicatura, baseando-se que as leis do discurso são respeitadas pelo autor do enunciado.

Neste caso, o princípio de cooperação foi respeitado pelo enunciador, mas de uma maneira indireta. Este tipo de implícito que se evidencia pelo confronto do enunciado com o contexto de enunciação é denominado subentendido.

O Pressuposto é, essencialmente, aquilo que se supõe antecipadamente. A pressuposição é de caráter mais lógico e não depende de tantas inferências, uma vez que faz-se conjecturas sobre o conteúdo, uma espécie de suposição a partir de um silogismo em que uma das premissas vem maior ou menor grau inscrita no enunciado.

Análise do corpus: notícia

Mc Donald’s se pinta de verde
Síntese da notícia
A rede de lanchonetes Mc Donald’s trocou o tradicional vermelho de seu logotipo por um verde escuro para buscar imagem mais “ambientalmente amigável”, na Europa. Cerca de 100 lanchonetes da rede na Alemanha vão fazer a mudança até o final do ano, de acordo com a companhia


O texto que temos como objeto de estudo pertence a um gênero jornalístico. Trata-se de uma notícia com a seguinte manchete: Mc Donalds se pinta de verde.


O leitor, ao se deparar com esta mensagem impressa na manchete, logo é persuadido a buscar uma interpretação para ela. Entretanto, o processo do discurso, então elaborado, impede uma decodificação imediata da mensagem, levando o destinatário a re-elaborar os processos da mensagem, procurando abstrair seu componente de significação, ativando frames e desenvolvendo cálculos interpretativos na busca de sentido.

Observemos o corpus analisado:

1- Da Manchete, podemos indicar que primeiro há a pressuposição de que a cor verde não fazia parte constituinte do modelo estético/visual da rede de lojas do Mc Donald’s.
2- Do Lead, “Empresa troca cor da logomarca na Europa para criar identidade ambiental” podemos pressupor dessa oração (a sublinhada) subordinada adverbial de finalidade que outrora a empresa não tinha sequer uma identidade ambiental, carecendo, pois, de mudanças com finalidades a atingir este objetivo.
3- “Comumente associado a obesidade e a má alimentação”. Neste trecho, pressupomos que o Mc Donald’s não é unanimidade no ramo de fast food e nem seus são tão saudáveis seus lanches.
4- “A mudança começa na Alemanha. Por pressuposição, temos a idéia de que o país Europeu ainda não havia tido a mudança da cor original para o verde “ecológico”, pretensão da empresa para vários países Europeus .
5- “O Mc Donald’s quer reposicionar a rede com o bastião do ambientalismo”: O próprio prefixo “re”, associado a palavra “posição” aponta para uma idéia mudança de posicionamento, uma outra tomada de atitude da rede de fast food, que ao que se pode pressupor, não tinha um posicionamento tão ostensivo em relação a questão ambiental.
6- “Simplicidade e um foco nas coisas essenciais são o novo desenho filosófico da empresa”. Esse texto é parte da fala do vice-presidente da empresa. Embora, talvez, não tivesse a intenção de dizê-lo, o que se pode pressupor dessa afirmação é que antes, o foco filosófico da empresa não era as coisas simples e essências, neste caso a questão ambiental.
7- “Com a nova aparência, queremos deixar clara a nossa responsabilidade com os recursos naturais...” Neste trecho, temos clara a idéia de que a aparência anterior, o tradicional vermelho e amarelo mostarda, não deixavam evidente a posição sócio-ecológica da empresa, ou seja, pressupõe que tal mudança de aparência é oportuna para explicitar maior comprometimento com as questões ambientais.
Esses pressupostos, presentes na materialidade lingüística são mais lógicos, a afirmação de uma idéia é ao mesmo tempo a negação de outra. É como o clássico exemplo do “João parou de fumar”, ora, se ele parou quer dizer que ele fumava antes. O mesmo acontece se negarmos: “João não parou de fumar”; quer dizer que ele é um fumante.

Em um texto, e isso inclui os gêneros jornalísticos, pressupor é uma forma de falar algo, sem dizê-lo de forma explícita, pronta. Para Ducrot (1969) o “pressuposto” refere-se à natureza de um elemento semântico veiculado pelo enunciado, enquanto o “subentendido” caracteriza a forma pela qual um elemento semântico é introduzido no sentido.

Falemos agora dos subentendidos que observamos nesta notícia. O primeiro elemento subentendido desta noticia é a atuação preocupação da Empresa em manter sua imagem aliada ao “verde” do ecologicamente correto. Por isso, temos ainda:

1-A empresa se preocupa em desenvolver ações de responsabilidade social porque isso melhora o marketing de sua imagem;
2-O verde, sua nova cor, será relacionará o compromisso da empresa com a questão ecológica, dando-lhe credibilidade e respeito diante da sociedade.
3- O Mc Donald’s, com isso, busca mais consumidores e clientes com uma imagem de empresa com responsabilidade social.
4- O Mc Donald’s investe em ações afirmativas na Europa porque é neste continente que mais sofre críticas quanto a produtos e serviços.
5- A troca da cor do logotipo influenciará diretamente nos lucros da empresa com mais simpatizantes do ambientalismo consumindo seus produtos.




Conclusão:

Estes são alguns dos pressupostos e subentendidos que achamos pertinentes ressaltar. Lembramos que pressupor e subentender é importante para a compreensão dos sentidos de um texto, e cabe ao leitos buscar retirar do texto e do contexto informações pertinentes a sua compreensão, levando em conta, é claro, o gênero em que este texto está veiculado.

Referências Bibliográficas:
CHARAUDEAU, Patrick. Linguagem e discurso: modos de organização. São Paulo: Contexto, 2008
FIORIN, Luiz José. Linguagem e Ideologia. São Paulo: Ed. Ática, 2000
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Cognição, linguagem e práticas interacionais. Rio de Janeiro, Lucerna, 2007a.
Apostilas avulsas dadas pelo professor

Site:

http://vista-se.com.br/redesocial/mc-donalds-verde/

Um comentário:

  1. Não estava conseguindo encontrar boas definições de pressupostos, por não encontrar os livro do Fiorin, agradeço muito esta sua postagem.
    Giane Barauna!

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